sexta-feira, junho 30, 2006

RETALHOS - A sabotagem (IV)



A notícia colheu meio mundo de surpresa. A BA3 era o maior complexo militar da Força Aérea sendo uma base de aviação de ligação, transporte e treino de tropas pára-quedistas, para além de ser uma unidade também de treino dos pilotos para a guerra colonial.
Fora ali desencadeada pela ARA (Acção Revolucionária Armada) uma acção com vinte cargas explosivas e incendiárias em vinte aviões e helicópteros. Para afrontar o regime e logo num santuário militar por excelência, infringindo pesadas baixas materiais em aviões de guerra bastaram três homens: um cabo miliciano, militar no activo precisamente na base de Tancos e quase a completar o curso de piloto de helicópteros dado por instrutores franceses; um ex-furriel enfermeiro militar com a especialidade de neuro-psiquiatria, com quase três anos de serviço em Moçambique donde tinha regressado em Março de 1969 e onde assistiu, impotente, às mortes e às vidas estropiadas por feri­mentos sem remédio de muitos combatentes involuntários; e o mais velho, 28 anos de idade, que também esteve na acção do Cunene, tendo sido soldado de uma companhia de caçadores conheceu em Angola, Ambriz e Lundas.
Às dez menos dez da noite, já estava na estação de comboios a comprar um bilhete, mas sem utilizar o “privilégio” de ser militar. Pagava mais caro, mas desta vez ia vestido à civil por ser mais seguro. Embarquei, não se via um militar fardado no comboio, por ser um dia de semana. Passei a noite de terça para quarta-feira, de 9 de Março de 1971, – precisamente no dia de aniversário de minha mãe deixando-a mais uma vez aflita – dentro de um comboio, mas desta vez não ia encafuado como em tantas outras viagens de fim-de-semana. Havia lugares sentados e desta vez, sentia-me mais cidadão, com mais direitos e olhado de forma diferente pelas pessoas.

1 comentário:

Anónimo disse...

O peso da responsabilidade, a cidadania tudo isso enaltece.
Ligia