sábado, junho 24, 2006

RETALHOS - O princípio do fim III (fim)

Naquela primeira semana, saí para a rua com mais 4 PA’s. Utilizávamos um unimogue que mais parecia uma pandeireta, dando sinais sempre que o condutor se deliciava a fazer perícias. Dar uma cambalhota e projectar-me, não para casa desenfiado, mas para a enfermaria com o chassis feito num oito, era sempre o mais provável.
Onde houvesse cheiro a militares da força aérea, lá estávamos nós para manter e impor a ordem, como se de um embarque, de militares para África, se tratasse.
Na segunda saída, calhou-me logo acompanhar um embarque no aeroporto. Tratava-se do pessoal da minha companhia que comigo andara, sofrera e vencera em Tancos.
“Nosso Pára, não dê confiança aos militares. Lembre-se que a você compete-lhe manter a ordem e a lei” – atalhou o comandante da ronda, um furriel todo emproado.
Mas qual quê, os camaradas de tantas privações passadas, mal me viram com o braçal da Policia Aérea, arrancaram-me da minha pose policial. Vi-me envolvido no meio deles confraternizando e dando a cada um, um abraço de despedida. Só lhes faltou, para desespero dos restantes PA, lançaram-me ao ar em tremenda gritaria. Ainda bem que imperou o bom senso. Ri, bebi, chorei e até embarquei com eles, pois o meu coração e um pedaço de mim, também iam para a Guiné.
Quando os vi na placa de embarque, a decisão ficou tomada: iria para casa sim senhor, mal me pudesse escapar desenfiar-me-ia. Que me poderia acontecer de fosse apanhado? Algum castigo era superior ao destes meus amigos que agora partiam? Sabia que nem todos iriam regressar e muitos dos que voltassem viriam com problemas de vária ordem na mente e nos ossos. Sabendo que militar é sinónimo de desenrascar, assim que chegasse ao alto de Monsanto, iria acertar isto com os meus camaradas: três de nós, iriam de férias

7 comentários:

Anónimo disse...

Parabens mais uma vez Marques, a tua escrita e narrativa é excelente, mas esta é a ultima vez que te dou os parabens, a proxima será quando autografares o livro que eu vou comprar da tua autoria, acho que deves isso ás gerações do presente passado e futuro

Anónimo disse...

Relata com tanta emoção,que nos conduz a viver esses momentos.
Ligia

Anónimo disse...

É verdade, devias escrever um livro, se já não o estás fazendo.
já te disse que você me emociona.

um beijo.

May

Anónimo disse...

Sabes eu acho que é difícil comentar os teus textos, pois trata-se de uma narrativa de experiências na própria pessoa, e que desperta a curiosidade de quem as lê. Os outros, que viveram coisas inimagináveis, situações que todos nós (os mais novos) que poderiam divulgar, e que fazem parte do imaginário de quem as não viveu mas que seriam uma mais valia para nós, e também quiçá para ajudar a afugentar, os traumas que alguns têm, porque eu acho que se guardarem para si essas situações isso não vos ajuda em nada, á alguns anos atrás (poucos) um elemento do fórum disse que este fórum é uma ajuda imensa para ele porque o ajudou a ultrapassar ou a ajudar a viver com os problemas que a experiência do ultramar lhe causou, é por isso e não só que eu também gostaria de ler aqui essas experiências vividas, mas infelizmente não consigo, eu adoro ler as vossa histórias, fascinam-me e atraem-me, talvez por eu ter sido um dos que ficou desapontado com o fim da guerra do ultramar, pois eu sempre quis ir para lá (desde puto) talvez coisas da juventude, e se calhar chegava lá e enfiava-me num buraco (o que eu duvido), essa é uma das minhas razões de tanto querer ver fotos e ouvir os meus camaradas velhinhos a contar o que lá fizeram e passaram, passei noites agradáveis no Parque Nascente e na APN a ouvir os meus amigos, e posso-te dizer é fantástico o que vocês fizeram as situações caricatas, as cómicas as dramáticas, enfim tudo e é uma pena que se vá perder todo esse legado de uma juventude, só porque se fecham em copas, mas tenho esperança que comece a aparecer alguma coisa.

Anónimo disse...

Continuas sempre a contar tua experiença com muita emoçao..
nao sei o que é um unimogue o uma pandeireta, se calhar uma sorte de jeep...
a foto também esta muito bém..nao mudastes muito, so um pouquinho..
um beijo

José Marques disse...

Cara Helena
Um Unimogue é um veículo militar tipo jipe mas pouco instável capotando com facilidade se se abusa um pouco dele nas curvas.
A Pandeireta é instrumento musical de percussão, formado por um aro de madeira com ou sem guizos, sobre o qual se estica uma pele e que se tange, batendo-se com a mão ou com os cotovelos.

Ambos rodopiam com facilidade

Gwendolyn Thompson disse...

É verdade, devias escrever um livro, se já não o estás fazendo.
já te disse que você me emociona.